Simplex Urbanístico. O risco da compra de casa sem Licença de Utilização.

O mercado vai ser inundado por imóveis ilegais e sem licença de utilização“. Esta afirmação é de Jorge Batista da Silva, bastonário da Ordem dos Notários, de cuja preocupação também partilho, como facilmente poderão constatar ao longo deste artigo.

Comecemos por recordar a publicação, no início deste ano, do Decreto-Lei n.º 10/2024, de 8 de janeiro, que “procede à reforma e simplificação dos licenciamentos no âmbito do urbanismo, ordenamento do território e indústria”. Este pacote legislativo, denominado de Simplex Urbanístico, procura, então, simplificar algumas formalidades relacionadas com a compra e venda de imóveis com o objetivo de facilitar o acesso à habitação. No total, engloba 26 novas medidas, sendo que a maioria entrará já em vigor no próximo dia 4 de março de 2024.

De uma forma global, ao pretender reformar e simplificar os licenciamentos em Portugal, o novo diploma traz, de facto, alguns benefícios seja para promotores, investidores imobiliários e famílias, dos quais destaco:

  • Vantagens ao nível da simplificação urbanística e predial – ao simplificar processos e procedimentos (eliminando licenças, autorizações, entre outros), reduz custos e tempo, assim como estimula ao investimento.
  • Possibilita a colocação de mais casas no mercado – ao remover barreiras burocráticas inerentes aos procedimentos de controlo prévio urbanístico e de ordenamento do território, é expectável que se traduza num aumento da oferta de habitação no mercado.
  • Introduz novos prazos para as autarquias decidirem sobre os pedidos de licenciamentos urbanísticos – o que obriga as câmaras municipais a serem mais ágeis e a criar uma maior transparência e previsibilidade nos procedimentos urbanísticos, impedindo que, nas mesmas matérias, existam regras e procedimentos diferentes.

 

Ainda sobre estes novos prazos há uma importante alteração que importa referir que é o facto de ter sido aprovado um regime de deferimento tácito para as licenças de construção. Isto significa que, caso as decisões não aconteçam no prazo definido, “o particular poderá realizar o projeto pretendido”.

Para além disso, este Decreto-Lei também elimina o alvará de licença de construção, sendo “substituído pelo recibo do pagamento das taxas devidas”.

E eis que chegamos ao busílis da questão!

No que respeita aos licenciamentos, desde 1 de janeiro de 2024 que o novo Decreto-Lei elimina a necessidade de obter licenças urbanísticas, criando-se, para o efeito, novos casos de comunicação prévia, de isenção e de dispensa de controlo prévio. Ou seja, ficam isentas de licenciamento as obras que aumentam o número de pisos, desde que não alterem a fachada dos edifícios, ou as construções em área com operação de loteamento, plano de pormenor ou unidade de execução com desenho urbano.

Se, por um lado, o Simplex Urbanístico não exige a apresentação da Licença de Utilização no momento da celebração do contrato de compra e venda, por outro lado, levanta receios de transações envolvendo propriedades com construções ilegais.

Além disso, a ausência de licença compromete a contratação de crédito à habitação, uma vez que os bancos exigem esse documento para avançar com o financiamento.

Então, qual é o impacto destas alterações na realização de negócios jurídicos que envolvam a transmissão de propriedade de prédios urbanos?

Embora a lei ressalve o dever de informação no ato de transmissão de propriedade de prédios urbanos, mantém-se a possibilidade de se transacionar quaisquer imóveis, mesmo que não disponham dos títulos urbanísticos necessários para a respetiva construção ou utilização.

Tal como alerta o bastonário da Ordem dos Notários, na entrevista que partilhei no início deste artigo, no limite, poderemos ter a situação de um comprador adquirir um imóvel que teria que ser demolido algum tempo depois, por ser ilegal.

Neste contexto de dúvidas e incertezas, especialmente em relação à segurança jurídica, gostaria de reforçar que, embora o Simplex Urbanístico traga vantagens, é essencial considerar cuidadosamente os seus impactos a longo prazo.

Neste sentido, a Ordem dos Notários já apresentou uma proposta da possibilidade de se poder vender e comprar um imóvel não licenciado, mas fazer depender isso da emissão pela câmara municipal de uma declaração que ateste se aquele imóvel, pelo menos, é licenciável ou não, e, desta forma, o comprador ter a noção de que se pode regularizar.

Entretanto, resta-nos aguardar por novos desenvolvimentos. Até lá, e para evitar problemas no futuro, o melhor será sempre procurar uma agência de mediação imobiliária que garanta que não há qualquer ilegalidade relativamente à licença de utilização do imóvel que está a comprar.

Da minha parte, estarei como sempre à sua disposição para o esclarecimento de qualquer dúvida e prestar-lhe o melhor serviço no processo de compra da sua nova casa!

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