
A propósito de um artigo que li recentemente sobre ética, sensibilidade e responsabilidade da comunicação social no tratamento, e consequente divulgação, de informações relacionadas com o imobiliário, apraz-me refletir sobre o tema.
Diariamente, deparamo-nos com notícias que revelam a crescente e preocupante dificuldade no acesso à habitação em Portugal, em particular por parte das famílias com salários médios e baixos. Dificuldade para a qual, nos últimos anos, muito tem contribuído a subida dos preços das casas no nosso país, a par dos elevados juros nos créditos habitação (embora, mais recentemente, com tendência de descida) e da perda de poder de compra.
No entanto, é neste âmbito que admito a minha perplexidade ao assistir ao apetite, por vezes quase voraz, dos media em disseminar notícias que mais não são do que informações cujo principal objetivo é serem bombásticas, mesmo que infundadas, criando no mercado (e nas pessoas) expetativas, sejam elas otimistas ou pessimistas.
É certo que os jornalistas se suportam (acredito eu) em fontes para corroborarem uma determinada informação. Mas, será que a troco de informações e/ou perceções em primeira mão, o jornalista não estará a descuidar a origem e a qualidade das suas fontes ou, por outro lado, a não ter a preocupação necessária em construir a notícia com recurso a uma pesquisa mais aprofundada e fundamentada, sem interpretações incorretas?
A análise e ou conclusões subjetivas conduzem a informação errada e, tal como referi anteriormente, a criar expetativas erradas (positivas ou negativas) por parte de quem lê a notícia.

Por estes dias, ao ler o Digital News Report Portugal 2024, publicado pelo OberCom – Observatório da Comunicação que colabora com o Reuters Institute for the Study of Journalism, deparei-me com a conclusão de que Portugal tem vindo a descer no ranking de confiança em notícias.
Após nove anos a ocupar a 2ª e a 3ª posição (desde que foi criado este relatório anual), em 2024, o nosso país caiu para a 6ª posição, com 56% dos portugueses inquiridos a dizerem confiar em notícias em geral e 58% a confiarem naquelas que consomem. Só a título de exemplo, referir que, em 2015, ambos os números eram superiores: 66%, no primeiro caso; e 71%, no segundo.
São dados que revelam um decréscimo da confiança dos portugueses nas notícias e que nos fazem refletir sobre qual os verdadeiros motivos para este decréscimo.
Em minha humilde opinião, considero que os media continuam a ter um papel central e importante, mas não basta apenas existirem e deixarem-se levar por discursos polarizados e a servirem como canal de difusão de uma determinada marca ou agenda. E, como tal, a criar ruído com potencial suficiente para relegar para segundo plano o que, de facto, é realidade.

A este respeito, partilho da opinião de Susana Pascoal, diretora de Marketing da Victoria Seguros, quando, no seu artigo sobre “O 4º poder e o setor imobiliário”, refere que “não há dúvidas que a aplicação deste poder ao setor da construção e imobiliário, tem sido, nestes últimos anos, uma realidade”. No mesmo artigo, datado de setembro de 2023, a propósito do impacto do “Pacote Mais Habitação” nos media, deixa-nos estas duas questões para reflexão:
“Seria possível este tema ter tanto impacto, ter ido tão longe, sem a intervenção do 4º poder?”
“Sem a capacidade de levar informação (sem ajuizar a sua qualidade) a um público tão alargado, sem a exposição dada ao setor, sem a contínua discussão, sem o alimentar deste ‘fogo’ por parte dos media?”
No meu ponto de vista, sem os media teria impacto, mas seria mais difícil e demoraria mais tempo. Agora, a maioria das informações veiculadas receberam o tratamento noticioso mais adequado? Não terão sido, em determinados momentos, criadas “falsas” expetativas nas pessoas?
Termino com uma breve referência ao Código Deontológico dos Jornalistas portugueses que impõe ao jornalista o dever de “relatar os factos com rigor e exatidão, bem como interpretá-los com honestidade. Os factos devem ser comprovados, ouvindo as partes com interesses atendíveis no caso. A distinção entre notícia e opinião deverá ficar bem clara aos olhos do público”.
Afinal, quem sabe mais sobre o mercado imobiliário? Os media ou os profissionais do setor?